proposta de lei de reconciliação 2005
Intervenção na discussão da proposta de lei de reconciliação 26/10/05
Esta proposta de lei do governo enquadra-se na maior operação cinismo e hipocrisia de que há memória em Cabo Verde. Também dá continuidade à campanha desencadeada por este Governo de difamar o processo de construção da democrática no país, ao mesmo tempo que procura estender uma rede de cumplicidades e de complacência em relação ao regime totalitário no quadro do sempre presente objectivo de branquear, de justificar e de enaltecer o Paigc e o Paicv.
De acordo com a proposta a lei diz que visa a reconciliação de todos os caboverdianos (n.1 do artigo 1) e o restabelecimento do emprego dos que sofreram perseguição política no periodo entre Julho de 1975 e Dezembro de 2000. Ou seja, durante o regime de partido único que vigorou do 5 de Julho de 75 até o 13 de Janeiro de 1991 e também durante a vigência da Constituição de 1992, portanto da democracia e do Estado de Direito democrático. A truculência e a irresponsabilidade deste Governo não podia ser maior.
Mas vamos aos factos:
1- A 25 de Abril a revolução em Portugal derrubou o regime de Salazar/Caetano e em consequência da mudança do regime os dignatários da então formação política dirigente a União nacional ou Acção Nacional Popular e os dirigentes e agentes da PIDE/DGS, a polícia política do regime foram colocados em posição de serem saneados da Função Pública portuguesa e suas ramificações na s colónias no quadro da lei de Julho de 1974. Para o efeito criaram-se comissões de saneamento em todos os pontos dos território português. Trata-se portanto de saneamento por virtude de mudança de regime, ou seja da passagem de um regime ditatorial para um regime democrático
2- Na sequência do 25 de Abril e da restauração de liberdades política no arquipélago, o Paigc passou a desenvolver actividade política clara nas ilhas e rapidamente estabeleceu a sua perspectiva de como o país podia ascender à independência: era contra a realização de um referendo; ele era o único representante do povo; Cabo Verde só podia ser independente com o Paigc. Com tal postura política O PAIGC criou um clima de intolerância e de intimidação em todo o arquipélago. A lei de 11/ 75, as como as prisões de dezembro de 1974 e as deportações de caboverdianos para Portugal são expressões dessa intolerância. Neste caso, as pessoas são perseguidas por razões de opinião: uns não concordavam com a forma como o Paigc queria a independência e outros não queriam a independência ou pelo menos não imediatamente.
3- Com o 5 de Julho e o país já independente o Paigc pôs-se a construir o regime totalitário que iria persistir o 13 de Janeiro. Parte da estratégia de construção do regime foi o controlo e a intimidação da administração pública no arquipélago. Assim para além da diminuição dos salários dos funcionários, de força-los a juramentos de fidelidade ao PAIGC e de instalar comites do partido nas repartições com funções de avaliação do desempenho do funcionários, ainda o Governo do Paigc através da lei 36/75 de 18 de Outubro de 1975 ameaçou com penas de prisão e expulsão da Função Pública todos os funcionários com qualque tipo de ligação à Pide mesmo os que, não sendo agentes nem informadores teriam desmonstrado, imaginel, especial zelo na colaboração com a Pide. Com esta lei uma espada de Demócles ficou suspensa sobre a cabeça de todos os funcionários durante a vigência do regime. Neste caso como no primeiro caso trata-se de saneamentos por mudança de regime. Só que agora, a mudança é no sentido de implantação de uma outra ditadura em Cabo Verde.
4- A partir de 13 de janeiro inicia-se outra vez uma mudança de regime – do regime do partido único para a democracia. Contrariamente ao que se passa na generalidade dos casos de mudança de regime, a transiçãoem Cabo Verde foi a mais inócua: Naturalmente que se extinguiu a polícia política (decreto lei n 27/91); porém todos os funcionários do corpo privativo do Paicv ex-partido único foram integrados na Função Pública, e o próprio ex-presidente da República, e ex-secretário do Paigc e Paicv durante todo o regime, sr Aristides Pereira passou a receber uma pensão vitalícia do Estado por força do decreto- lei 29/91 de 13 de Abril de 1991. O decreto-lei n. 119/91 que o Governo apresenta como base de perseguição política nos primeiros dez anos de experiência de democrática no país simplesmente retira a possibilidade aos combatentes que o partido único tinha colocado em empresas públicas e em categorias em que não fazem parte da carreira ( por exemplo administrador) de poderem integrar o quadro de pessoal dessas empresas e eventualmente obter a reforma nessas categorias. É essa a grande prova de existência de perseguição política no Cabo Verde democrático e no Estado de Direito erigido com base na Constituição de 1992.
Face aos factos, o que os caboverdianos deviam esperar do Paicv e dos seus dirigentes para uma real reconciliação de toda a nação caboverdiana era o seguinte:
1 – Um pedido formal de desculpas pelas injúrias, perseguições, prisões e deportações que muitos sofreram por ter opinião contrária em relação à forma como se processou a independência de Cabo Verde
2 – Um pedido formal de desculpas ao país pelos quinze anos de regime de partido único que roubou a liberdade aos caboverdianos e impediu que o país hoje tivesse os níveis de desenvolvimento que um país democrático e de economia aberta poderia ter como bem provam as experiências de Botswana e das Maurícias com rendimentos per capita de 5000, e 8000 dólares, respectivamente.
3 – que compensassem devidamente os que sofreram prisão e torturas em todos os pontos do país, designadamente em 1977 em S.Vicente e S.Antão, na Praia em Dezembro de 1980 e na sequência do 31 de Agosto em S.Antão.
4 – Que restaurassem ou compensassem todos os que viram os seus direitos de propriedades violados e não só até Dezembro de 1980, como está na proposta do Governo, mas que compreendesse também, e particularmente, o período da reforma agrária.
5 – Finalmente que o Paicv aceitasse que hoje é um dos pilares do sistema democrático em Cabo Verde, que o seu dever é trabalhar com toda a lealdade para a consolidação da democracia e que deixasse de justificar o que é injustificável e de ficar pasmado a olhar para o passado em vez de pensar e construir o futuro.
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