Thursday, October 27, 2005

proposta de lei de reconciliação 2005

 

Intervenção na discussão da proposta de lei de reconciliação           26/10/05

 

 

Esta proposta de lei do governo enquadra-se na maior operação cinismo e hipocrisia de que há memória em Cabo Verde. Também dá continuidade à campanha desencadeada por este Governo de difamar o processo de construção da democrática no país, ao mesmo tempo que procura estender uma rede de cumplicidades e de complacência em relação ao regime totalitário no quadro do sempre presente objectivo de branquear, de justificar e de enaltecer  o Paigc e o Paicv.

 De acordo com a proposta a lei diz que visa a reconciliação de todos os caboverdianos  (n.1 do artigo 1) e o restabelecimento do emprego dos que sofreram perseguição política no periodo entre Julho de 1975 e Dezembro de 2000. Ou seja, durante o regime de partido único que vigorou do 5 de Julho de 75 até o 13 de Janeiro de 1991 e também durante a vigência da Constituição de 1992, portanto da democracia e do Estado de Direito democrático. A truculência e a irresponsabilidade deste Governo não podia ser maior.

 Mas vamos aos factos:

 1- A 25 de Abril a revolução em Portugal derrubou o regime de Salazar/Caetano  e em consequência da mudança do regime os dignatários da então formação política dirigente a União nacional ou Acção Nacional Popular e os dirigentes e agentes da PIDE/DGS, a polícia política do regime foram colocados em posição de serem saneados da Função Pública portuguesa  e suas ramificações na s colónias no quadro da lei   de Julho de 1974. Para o efeito criaram-se comissões de saneamento em todos os pontos dos território português. Trata-se portanto de saneamento por virtude de mudança de regime, ou seja da passagem de um regime ditatorial para um regime democrático

2- Na sequência do 25 de Abril e da restauração de liberdades política no arquipélago, o Paigc passou a desenvolver actividade política clara nas ilhas e rapidamente estabeleceu  a sua perspectiva de como o país podia ascender à independência: era contra a realização de um referendo; ele era o único representante do povo; Cabo Verde só podia ser independente com o Paigc. Com tal postura política O PAIGC criou um clima de intolerância e de intimidação em todo o arquipélago. A lei de 11/ 75, as como as prisões de dezembro de 1974 e as deportações de caboverdianos para Portugal são expressões dessa intolerância. Neste caso, as pessoas são perseguidas por razões de opinião: uns não concordavam com a forma como o Paigc queria a independência e outros não queriam a independência ou pelo menos não imediatamente.

 3- Com o 5 de Julho e o país já independente o Paigc pôs-se a construir o regime totalitário que iria persistir o 13 de Janeiro. Parte da estratégia de construção do regime foi o controlo e a intimidação da administração pública no arquipélago. Assim para além da diminuição dos salários dos funcionários, de força-los a juramentos de fidelidade ao PAIGC e de instalar comites do partido nas repartições com funções de avaliação do desempenho do funcionários, ainda o Governo do Paigc através da lei 36/75 de 18 de Outubro de 1975 ameaçou com penas de prisão e expulsão da Função Pública todos os funcionários com qualque tipo de ligação à Pide mesmo os que, não sendo agentes nem informadores  teriam desmonstrado, imaginel, especial zelo na colaboração com a Pide. Com esta lei uma espada de Demócles ficou suspensa sobre a cabeça de todos os funcionários durante a vigência do regime.  Neste caso como no primeiro caso trata-se de saneamentos por mudança de regime. Só que agora, a mudança é no sentido de implantação de uma outra ditadura em Cabo Verde.

4- A partir de 13 de janeiro inicia-se outra vez uma mudança de regime – do regime do partido único para a democracia. Contrariamente ao que se passa na generalidade dos casos de mudança de regime, a transiçãoem Cabo Verde foi a mais inócua: Naturalmente que se extinguiu a polícia política (decreto lei n 27/91); porém todos os funcionários do corpo privativo do Paicv  ex-partido único foram integrados na Função Pública, e o próprio ex-presidente da República, e ex-secretário do Paigc e Paicv  durante todo o regime, sr Aristides Pereira passou a receber uma pensão vitalícia do Estado por força do decreto- lei 29/91 de 13 de Abril de 1991. O decreto-lei n. 119/91 que o Governo apresenta como base de perseguição política nos primeiros dez anos de experiência de democrática no país simplesmente retira a possibilidade aos combatentes que o partido único tinha colocado em empresas públicas e em categorias em que não fazem parte da carreira ( por exemplo administrador) de poderem  integrar o quadro de pessoal dessas empresas e eventualmente obter a reforma nessas categorias.  É essa a grande prova de existência de perseguição política no Cabo Verde democrático e no Estado de Direito erigido com base na Constituição de 1992.

Face aos factos, o que os caboverdianos deviam esperar do Paicv e dos seus dirigentes para uma real reconciliação de toda a nação caboverdiana era o seguinte:

1 – Um pedido formal de desculpas pelas injúrias, perseguições, prisões e deportações que muitos sofreram por ter opinião contrária em relação à forma como se processou a independência de Cabo Verde

2 – Um pedido formal de desculpas ao país pelos quinze anos de regime de partido único que roubou a liberdade aos caboverdianos e impediu que o país hoje tivesse os níveis de desenvolvimento que um país democrático e de economia aberta poderia ter como bem provam as experiências de Botswana e das Maurícias com rendimentos per capita de 5000, e 8000 dólares, respectivamente.

3 – que compensassem devidamente os que sofreram prisão e torturas em todos os pontos do país, designadamente em 1977 em S.Vicente e S.Antão, na Praia em Dezembro de 1980 e na sequência do 31 de Agosto em S.Antão.

 4 – Que restaurassem ou compensassem todos os que viram os seus direitos de propriedades violados e não só até Dezembro de 1980, como está na proposta do Governo, mas que compreendesse também, e particularmente, o período da reforma agrária.

 5 – Finalmente que o Paicv aceitasse que hoje é um dos pilares do sistema democrático em Cabo Verde, que o seu dever é trabalhar com toda a lealdade para a consolidação da democracia e que deixasse de justificar o que é injustificável e de ficar pasmado a olhar para o passado em vez de pensar e construir o futuro.

Thursday, August 25, 2005

Debate do conceito estratégico de Defesa Nacional 2005

 

Intervenção no debate das grandes opções do conceito estratégico de defesa e segurança

 

                                                                       Humberto Cardoso   (23/5/05)

 

A problemática da segurança das nações é hoje vista num outro prisma devido essencialmente a dois fenómenos recentes: o fim da guerra fria e a aceleração da globalização.

 De facto, com o desaparecimento da União Soviética, os  Estados Unidos da América afirmaram-se como a única potência capaz de projectar força ao nível planetário. Despontou uma nova era em desaparecem as guerras entre Estado-Nações. Não terminaram porém os conflitos armados e as ameaças à paz . Os protagonistas  dos novos conflitos passaram a ser entidades infra estatais e as motivações de natureza étnico e religiosa. O terrorismo, que até então se tinha mantido contido e instrumental no quadro das necessidades tácticas de lutas com objectivos mais abrangentes, ganhou foros estratégicos visando aplicar profundos danos materiais e maximizar perdas humanas, especialmente de civis.

 O processo de globalização alargou-se com a inserção na economia mundial de várias países anteriormente na órbita soviética e  com o aprofundamento da integração económica da China e da India e acelerou com os extraordinários investimentos e inovações nas tecnologias de informação e comunicação realizados ao longo de toda década de noventa. Os níveis de conectividade entre pessoas e regiões do globo aumentaram exponencialmente.

 Entidades terroristas como Al Qaeda aproveitaram-se das novas condições para desenvolverem uma rede com alcance mundial  e de fazer convergir numa plataforma de interesses comuns o terrorismo internacional e actividades criminosas organizadas como o tráfico de drogas, tráfico de armas, tráfico humano e operações de lavagem de dinheiro. Paralelamente e particularmente através da Internet,  muitos, no mais perfeito anonimato ganhavam acesso a informações, produtos e técnicas que punha à disposição de indivíduos e de pequenos grupos uma capacidade de destruição anteriormente reservada a forças militares.

 A destruição das torres gémeas do World Trade Center em Nova Iorque no dia 11 de Setembro de 2001 no âmbito de um ataque sincronizado em que também eram alvos o Pentágono e a Casa Branca revelou o aparecimento de uma nova ameaça à segurança das nações. Uma ameaça transnacional, que se manifesta sem se identificar, que procura infligir o maior estrago possível e provocar o maior número de vítimas, de preferência civis, e que activamente procura pôr à sua disposição todo o tipo de armas de destruição massiva , sejam elas nucleares, químicos, biólogicos  e radiológicos.

 Com esse tipo de ameaça, em que indivíduos e grupos agindo como criminosos realizam actos de guerra, esbate-se significativamente a tradicional separação entre a segurança interna e a segurança externa. 

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Sr. Presidente

 A Constituição da República no artigo 242 e seguintes referentes à Defesa Nacional e o artigo 240 dedicado à polícia faz uma diferenciação clara entre a o conceito de defesa nacional e o conceito de segurança interna. Nesses mesmos artigos a Constituição atribui às forças armadas a tarefa de fazer face a ameaças ou agressões externas e à polícia e forças de segurança a responsabilidade de garantir a segurança interna, defendendo em simultâneo os direitos dos cidadãos e a legalidade democrática.

 A distinção feita pela Constituição da República reflecte uma época em as ameaças ou agressões do exterior eram claramente identificáveis nas declarações, actos ou movimentação de forças de outros Estados. Manifestações de hostilidade não se confundiam nem na forma nem nos métodos e, muito menos, no poder de fogo com qualquer ameaça interna. Hoje, porém, dificilmente  se pode fazer essa distinção. Entretanto, persiste o constrangimento constitucional.

 Tudo leva a crer que na ausência de uma revisão constitucional que permitisse uma abordagem conjunta da problemática da defesa e da segurança interna no âmbito de um novo conceito de segurança nacional somos obrigados a discutir separadamente as opções do conceito estratégico de defesa nacional e as opções do conceito estratégico de segurança interna. É o que aliás se vai fazer em Portugal, com a discussão já anunciada pelo Ministro português António Costa das opções do conceito estratégico de segurança interna.

 A discussão das grandes opções para além de definir os aspectos doutrinais e organizacionais, de diferenciar os aspectos estratégicos dos operacionais, clarifica missões e estabelece sistemas de forças. Ora a polícia e as forças armadas são completamente diferentes. A função de polícia é uma função da Administração portanto, segundo os constitucionalistas  directamente sujeita ao governo. As forças armadas constituídas com base no serviço militar obrigatório são na realidade um corpo de cidadãos armados para a defesa da Pátria em que os vários orgãos de soberania a começar pelo Presidente da República que é o Comandante Supremo das Forças Armadas têm competências na sua organização funcionamento e disciplina.

 As forças armadas são treinadas para responder de forma decisiva e letal a qualquer agressão do exterior. À Polícia exige-se uma actuação efectiva, mas responsável, com sentido de proporcionalidade e respeitando escrupulosamente os direitos fundamentais dos cidadãos. Os meios, os métodos e a estratégias de actuação não podem ser os mesmos. 

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Sr. Presidente

 terrorismo afirmou-se de facto como a ameaça mais letal enfrentada pelas sociedades modernas. O caracter global das suas actividade e a utilização sistemática dos recursos da sociedade moderna, particularmente das tecnologias de informação e comunicação, fazem de todos os países do mundo potenciais teatros de operações. Os países, ou são alvos, ou funcionam como bases logísticas dos terroristas ou transformam-se em refúgios e esconderijos onde em  momentos de aperto combatentes diluem-se na população.

Cabo Verde, um país que progressivamente vai se apercebendo de que as suas esperanças de

se desenvolver passam pela construção inteligente de uma dinâmica com a economia mundial, no quadro da globalização, não pode ficar alheio a esses perigos nem deixar de se preparar para os enfrentar .

A consolidação da liberdade e da democracia está intimamente ligada ao sucesso que se obtiver no processo de desenvolvimento designadamente em elevar significativamente o nível de vida da população com crescimento da riqueza nacional e com criação de emprego. Esse sucesso só é possível se efectivamente se souber construir relações económicas frutíferas com o mundo, envolvendo exportações de bens e serviços, atracção de investimento significativos para o país e produção de fortes fluxos turísticos capazes de emprestar dimensão crítica a muitos sectores da economia caboverdiana. Um factor chave do nosso sucesso é o nível de segurança atingido em todos os pontos do território nacional e a garantia que se dá aos outros que o  nosso território, a nossa sociedade e as nossas instituições não dão guarida a factores propiciadores de tráficos e práticas criminosas.

Nesta perspectiva, para nós, a  definição de um conceito de estratégia de segurança nacional no seu sentido lato passa pela compreensão dos requisitos que o processo de globalização impõe a todas as economias e a todas as sociedades, passa pela necessidade de se adequar a atitude nacional à exigências de uma interacção intensa com o mundo, uma interacção prenhe de potencialidade mas também de perigos,  e passa ainda pela capacidade de lançar um olhar crítico, firme e criativo pelas nossas instituições, pela forma como os recursos são alocados internamente e pelas abordagens muitas vezes despidas de visão estratégica com que se enfrentam os problemas do país.

Aos condicionalismos globais a considerar nesse exercício devemos juntar os de natureza regional.

O posicionamento de Cabo Verde na região ocidental africana numa zona onde se cruzam rotas internacionais de tráfico de drogas, de armas e de pessoas coloca o país necessáriasmente nos ecrans dos radares tanto dos traficantes como dos países alvo desses tráficos. A situação actual de ameaças permanentes de desestruturação de estados nesta zona em consequência de conflitos étnicos e religiosos como aconteceu recentemente em Serra Leoae Libéria, está acontecer na Costa do Marfim e poderá vir acontecer na Guiné Bissau põe Cabo Verde na contingência de se ser ver  a braços com fluxos insustentáveis de imigrantes ou refugiados. A fronteira porosa que se mantem, no quadro da CEDEAO, com esses países em perigo de se transformaram em Estados falhados agrava exponencialmente os efeitos da nossa proximidade desta região.

As ameaças à segurança nacional são múltiplas. Desde logo a necessidade de se controlar o fluxo de imigrantes numa realidade como a caboverdiana de população diminuta e  distribuída esparsamente pelas ilhas. Gerindo o fluxo Cabo Verde  poderá ganhar  e evita-se o desenvolvimento de sentimentos xenófobos. Por outro lado, o controle das fronteira deve ser rigoroso para impedir designadamente que elementos de entidades sub estatais associados aos múltiplos tráficos que antes sustentarem os seus conflitos venham prosseguir as suas actividades no nosso país.

Todo o desenvolvimento de Cabo Verde poderá ficar comprometido se deixarmos passar a péssima imagem de Cabo Verde ser uma espécie de ponte entre regiões instáveis da África e a Europa.

Sr. Presidente....

A natureza das ameaças actuais impõe que debruçemos de forma séria e comedida sobre as nossas múltiplas realidades

- a realidade fisica do nosso país, um país arquipélago com dez ilhas e ilhéus com cerca de 965 Km de linha costeira,

- a realidade geografica de estarmos situados numa região onde há sinais de desestruturação de estados e  onde se cruzam rotas de tráficos diversos, ligando três continentes,

- a realidade demográfica de uma população extremamente pequena 

- a realidade económica de um país que ainda não atingiu níveis de cescimento económico necessários para garantir uma efectiva luta contra a pobreza 

- a realidade social de grande desemprego e de tentações para o práticas ilegais com vista a enriquecimento rápido

- e uma realidade política de uma democracia jovem ainda em fase de consolidação e de institucionalização.

Hoje, em CaboVerde, a  inadequação das instituições nacionais face aos desafios seja da segurança interna como da segurança externa é  por demais evidente. A sensação de insegurança prevalecente na população tem origem na percepção generalizada das  dificuldades das instituições responsáveis pela luta contra a criminalidade e pela administração da justiça em  lidar com um país e uma sociedade cada vez mais complexos e em interacção permanente com um mundo em acelerado processo de globalização

As nossas fronteiras têm de deixar de ser porosas, as nossas costas devem ser efectivamente policiadas, a população deve sentir-se segura nas suas casas, a actividade criminal deve ser energicamente combatida. Para atingir esses objectivos temos que ser capazes de repensar tudo:

Qual deve ser o papel das forças armadas? Na nova conjuntura deve-se manter ou não as forças armadas?

Que tipo de força se adequa mais à necessidade urgente de policiamento das nossas costas águas arquipelágicas, águas territoriais e zona económica exclusiva

Qual deve ser o papel da POP?  Qual o seu papel no combate ao crime? 

O que se deve fazer para focalizar a actividade da polícia judiciária na luta contra os crimes complexos  e aumentar a sua capacidade  analítica?

Será de interesse para o país a criação de uma força de segurança para militar a exemplo de vários outros países que vigie as nossas costas e e dê um apoio mais robusto à acção das ouras polícias? 

Qual deve ser a nossa estratégia em matéria de cooperação no domínio de Segurança? Parece-nos evidente que uma verte central dessa cooperação terá que orientar-se para a protecção das nossas águas e da nossa zona económica exclusiva. 

Somos de opinião que a adequação das instituições aos desafios de hoje é urgente e a ponderação das opções a adoptar deve ser iniciada no âmbito de preparação de uma revisão constitucional.

O Movimento para a Democracia desde de 2001 tem vindo a manifestar ao Governo a sua disposição em colaborar com as importantes reformas de estado, designadamente nos sectores da forças armadas e da segurança. Lamentamos que só no fim do mandato o governo vemha apresentar as suas iniciativas . A vontade de colaborar continua. Esperamos que o Governo eo Paicv se disponibilizem para uma discussão compreensiva da matéria de segurança e que estejam dispostos a achegar aos compromissos que se impões.

 

                                                                                                          Muito obrigado.

A problemática da cessação de mandato

  A problemática da cessação de mandato                                                                                               ...